Editorial | Revista Parêntese

Parêntese #240: Morreu mas não virou santo

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Parêntese #240: Morreu mas não virou santo Foto: Roberto Nemamis/SBT

O coração sugere que a gente releve o lado ruim dos falecidos e enfatize as coisas boas. Mas tudo tem limite. Sílvio Santos, falecido esses dias, não virou santo por haver ido da vida para o escuro do nada. (Nem ele, nem o Delfim Netto.)

O que realmente me deixava indignado com o bem sucedido animador de auditório era a desfaçatez com que humilhava pessoas – não apenas por perguntas embaraçosas, mas pela forma despudorada com que jogava cédulas de dinheiro para a massa ululante que o cercava. 

Pode ser que seja uma reserva de tipo classe-média essa minha, e pode ser que aqueles, ou melhor, aquelas mulheres que ganhavam uma ou outra nota de 50 pila ficassem satisfeitas, sem mais. Mas ele as rebaixava ao fazer isso, para mim.

Para nem falar do contraste entre a boa-fé alvar com que as pessoas do auditório lutavam por uma nota de dinheiro e a fortuna que essa figura acumulou. O que ele fez com isso? Que gesto de grandeza ele teve para com o povo brasileiro que o tornou um nababo? 

Um exemplo evidente: enquanto pôde, rejeitou o pedido do Zé Celso Martinez Corrêa para ceder um terreno para fazer um parque junto ao teatro Oficina. Um terreno que deveria representar migalha, certamente menos de 1% de seu patrimônio. 

Nesse ponto, a cultura estadunidense tem virtudes que, perfeitamente dentro do sistema capitalista, deveriam ser seguidas pelos ricos daqui. Um camarada com a grana do SS deveria ter organizado uma fundação e dotado ela de um fundo poderoso, de alguns milhões de dólares, cujo rendimento poderia oferecer bolsas para atletas brasileiros, ou para estudantes pobres, ou quem sabe para financiar a restauração do Museu Nacional, qualquer coisa dessas.

O livro de Maurício Stycer Topa tudo por dinheiro – as muitas faces do empresário Sílvio Santos, da editora Todavia, é um excelente ponto de partida para ver de corpo inteiro essa figura. Se não quiser mais detalhes, basta ler o título, que SS usava como uma forma de tripudiar da plateia, dos concorrentes: o cara fazia questão de esfregar na cara da massa que ela, perdida, topa qualquer coisa pelo dinheiro. Dinheiro que ele acumulou de modo obsceno. 

PS: enquanto isso, cá na aldeia, vale a pena ler o artigo do engenheiro Vicente Rauber, para o Sul21, sobre o relatório dos holandeses que a RBS e o governador Leite, fazendo pose de cosmopolitas e amigos da ciência, estão celebrando, mais uma vez atropelando o conhecimento acumulado aqui mesmo, em pessoas como o Rauber e em instituições como o IPH da UFRGS. 

Luís Augusto Fischer 


Nesta edição 

2024 marca o centenário de morte de Franz Kafka. Na edição de hoje trazemos uma entrevista de Luís Augusto Fischer com Marcelo Backes, um dos mais importantes tradutores do autor para a língua portuguesa. 

A série de reportagens sobre os imigrantes venezuelanos no bairro Sarandi continua, em texto de Rodrigo Flores. Fernando Seffner aparece novamente por aqui, com mais análises sobre a cultura argentina. Sergio Faraco, nomeado patrono da próxima edição da Feira do Livro de Porto Alegre, recebe uma homenagem de Paulo Damin. Outra homenagem é prestada por Ricardo Almeida ao saudoso Rui da Palmarinca.

Breno Serafini faz uma crônica sobre uma crônica de Gregório Duvivier. Na data de 70 anos de morte de Getúlio Vargas, Juremir Machado da Silva compartilha o trecho de seu romance, que narra os momentos finais do político. E Alfredo Fedrizzi escreve sobre Elon Musk. 

Além do texto de Fischer que encerra a série sobre literatura de teutodescendentes e de um novo capítulo da biografia musical de Porto Alegre, por Arthur de Faria, ainda temos resenhas, com boas dicas de leituras, escritas por Gustavo Borba e Helena Terra.

Para fechar, deixamos um convite: o ensaio fotográfico de Brenda Andrade que retrata o impacto da enchente de maio em Eldorado do Sul, publicado na Parêntese #231, virou exposição. Onde Antes Habitava Vida está em cartaz no saguão do prédio 7 da Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS), e pode ser visitado até 31 de outubro, das 8h às 22h30, durante o horário de funcionamento da universidade. Vale a pena conferir! 

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