Reportagem

Dmae tem mais CCs e menos servidores ao longo da gestão Melo

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Dmae tem mais CCs e menos servidores ao longo da gestão Melo Folha salarial do executivo municipal como um todo: cresce o número de pessoas contratadas em cargos comissionados, diminui o quadro de concursados. Foto: Luciano Lanes/PMPA

O Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) observou um incremento substancial de cargos comissionados (CCs) na gestão de Sebastião Melo (MDB), a despeito da redução no número geral de seu quadro de trabalhadores. Segundo a folha salarial de abril de 2024, eram 84 CCs na autarquia. Em janeiro de 2021, mês em que assumiu o novo governo, havia 49 funcionários indicados por políticos – o que representa um aumento de 71,4% ao longo de três anos e três meses.

A equipe concursada, por outro lado, encolheu. São 1.300 pessoas agora, contra 1.441 em janeiro de 2021 – redução de 9,8%. No caso de concessões de funções gratificadas (FGs), o número atual é de 416 trabalhadores, enquanto em janeiro de 2021 eram 399. Esses postos são dados a servidores efetivos do município, para atribuições de chefia, direção e assessoramento.

A folha de pagamento do departamento cresceu abaixo do ritmo da inflação nesse mesmo recorte temporal: na competência abril de 2024, o gasto foi de R$ 15.125.140. Em janeiro de 2021, o município desembolsou R$ 13.669.352 com salários do Dmae, considerando concursados ou comissionados. Com um acumulado de 24% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o valor precisaria chegar a R$ 16,95 milhões para que estivesse reajustado. 

No departamento há 17 pessoas cujas remunerações básicas brutas excedem o valor do subsídio do prefeito Melo, que é de R$ 22.677,06 mensais, conforme a folha salarial de abril – todos esses salários são de pessoas com FGs ou CCs.

Os dados desta reportagem foram obtidos no Portal da Transparência da prefeitura, observando as tabelas de remuneração dos servidores. 

A considerar a totalidade da folha salarial do executivo municipal – com todas as suas secretarias, gabinetes e autarquias –, observa-se um cenário similar: cresce o número de pessoas contratadas em cargos comissionados, ao passo que  diminui o quadro de concursados. 

O total de servidores da prefeitura em abril de 2024 era 33.516 pessoas, enquanto os cargos de confiança eram 664. Em janeiro de 2021, contudo, eram 35.341 servidores e 522 CCs – cai 5,16% o número de concursados, cresce 27,2% o número de comissionados. 

A Matinal buscou os dados referentes ao final do governo de Nelson Marchezan Jr. (PSDB) – para tanto, foram observados os dados de setembro de 2020, mês anterior à eleição daquele ano, na qual Porto Alegre elegeria Melo como prefeito. 

Marchezan, à época, contava com 764 pessoas alocadas em cargos comissionados, mais do que o verificado atualmente na administração Melo – no caso do Dmae, eram 70 CCs, menos que em abril deste ano. Em setembro de 2020 eram 1404 servidores ativos no departamento, e a prefeitura dispunha de 35.788 trabalhadores.

“Quando Melo pegou, já era bem ruim”, diz diretor do Simpa

É preciso ter atenção às circunstâncias para além dos números, diz um dos diretores do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa), Edson Zomar de Oliveira, que é servidor do Dmae. “Quando Melo pegou, já era bem ruim”, afirma ele, sobre a comparação da situação contemporânea com o início do governo atual.

Uma parcela relevante da folha salarial do departamento – dados que não constam nas tabelas oferecidas pelo Portal da Transparência da prefeitura – é composta por servidores temporários ou adidos, que vêm de outras secretarias e não compõem o quadro permanente da autarquia. 

“Temos metade do quadro de servidores necessário”, alega Zomar. As especificidades do trabalho no Dmae, para o sindicalista, demandam o trabalho de profissionais de carreira, pelo acúmulo de conhecimento sobre os sistemas geridos pelo departamento. A lacuna, portanto, não se dá apenas no número de trabalhadores, mas também nos conhecimentos necessários para os serviços. 

“Quando começam a aprender a desempenhar, aí acaba o contrato deles. Então é um trabalho que ajuda, mas não substitui”, diz, referindo-se aos contratos temporários e também a profissionais terceirizados que prestam serviço ao Dmae.  

Zomar afirma que os terceirizados ganham de 30% a 40% dos salários do pessoal do quadro. “Há um rodízio de mão de obra muito grande. Então, quando adquire conhecimento e consegue uma situação melhor, o trabalhador sai. Isso também prejudica a qualidade do serviço, diminui o comprometimento, já que objetivo não é fazer carreira e sim estar ali enquanto busca outro emprego. Isso causa também muito trabalho duplicado, que precisa ser refeito por equipes já definhadas”, argumenta o diretor do Simpa.  

Sobre o aumento do número de cargos comissionados, Zomar diz que esses contratos não podem substituir o trabalho dos empregados de carreira. “Normalmente, esses seriam cargos de assessoria junto à direção, o que é normal, ter um gabinete da confiança. No Dmae, em várias áreas, há cargos de confiança. Na área administrativa, em especial, e em algumas áreas de engenharia, que vai faltando pessoal, eles aproveitam e vão ocupando pelo critério político, para suprir uma mão de obra com pessoas indicadas por eles”, relata.

Municipários denunciam, há anos, que a redução do quadro técnico precariza o Dmae visando uma futura concessão à iniciativa privada. Reportagem da Matinal de dezembro de 2022 mostrou que Sebastião Melo ignorou pelo menos sete pedidos para repor servidores da autarquia entre 2021 e 2022. Desde 2018, foram pelo menos 15 pedidos para reposição de funcionários.

“Isso tem consequências. Quando há economia em mão de obra, com pessoas sem as condições adequadas para desempenhar suas atividades, vem a situação crítica e não se consegue ter resposta. Trabalham com uma lógica mínima”, protesta o diretor do Simpa.

Solicitação da reportagem sobre gasto com CCs tinha o dia 15 de abril como prazo final de resposta.

Prefeitura ignora pedido de informações da Matinal

A reportagem da Matinal protocolou, em 26 de março, uma solicitação de dados referentes ao gasto da prefeitura com cargos comissionados ao longo do mandato de Sebastião Melo, através da Lei de Acesso à Informação (LAI). Esses elementos não estão nas tabelas oferecidas no Portal da Transparência da prefeitura de Porto Alegre. O prazo final era 15 de abril, ainda antes da cheia que atingiu a capital. No sistema eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão, o pedido da reportagem consta como “aguardando resposta”. 

Para qualquer nível de governo – federal, estadual ou municipal – a LAI dá 20 dias para resposta, com a possibilidade de prorrogação por mais dez, desde que justificada.

Conforme a plataforma WikiLAI, da agência de dados independente Fiquem Sabendo, a não resposta a um pedido é considerada “rara, gravíssima e pode ensejar punições aos responsáveis pela omissão”. Desde que a legislação de transparência passou a valer, em 2012, houve somente 354 omissões em todos os órgãos do governo federal, em um universo de mais de 1 milhão de pedidos de informação, segundo dados de 2021.

A Matinal entrou em contato com o Dmae e a assessoria de imprensa da prefeitura, para um posicionamento sobre os dados públicos apresentados na reportagem, mas não obteve resposta até o fechamento deste texto. 


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