Juremir Machado da Silva

Política e jornalismo segundo Flavio Tavares

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Política e jornalismo segundo Flavio Tavares Foto: Arquivo TVE/RS

Aos 90 anos de idade, Flavio Tavares é, como se diz, uma lenda viva do jornalismo brasileiro. Nascido em Lajeado, em 1934, tem 70 anos de jornalismo ativo nas costas. Durante o ciclo ditatorial da América Latina, começado com o golpe midiático-civil-militar de 1964 no Brasil, esteve preso três vezes. Sequestrado por um grupo clandestino do exército uruguaio, permaneceu 26 dias algemado e de olhos vendados. Depois, passou seis meses numa prisão uruguaia. Foi torturado. Ainda tem pesadelos com o que sofreu. Nando Gross e eu entrevistamos Flavio Tavares no videocast “Do lado de cá”, que fazemos para o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre. Um dos pontos interessantes foi a sua visão sobre a campanha eleitoral de 2024.

Tavares entende que a campanha foi totalmente entregue pelos partidos para agências de propaganda. Quem dá o tom são os marqueteiros. Reconheceu que a propaganda de Sebastião Melo na televisão é bem-feita tecnicamente. Em contrapartida, observou, reduz o conteúdo a estratégias populistas de comunicação, como a do simplório homem do chapéu de palha. Para Flavio Tavares em nenhum outro país o marketing tem tanto espaço e poder como no Brasil. Além disso, as agências abocanham fatias importantes do orçamento público destinado aos partidos para as campanhas eleitorais. É uma privatização de recursos pagos pelos contribuintes. Ele lembrou que durante muito tempo os partidos eram sustentados pelas contribuições dos filiados.

O veterano jornalista, que foi repórter do icônico jornal Última Hora, de Samuel Wainer, votou em Juliana Brizola no primeiro turno da eleição em Porto Alegre, “até em homenagem ao avô dela, Leonel Brizola”. Para ele, o enfrentamento à candidatura de Melo teria sido possivelmente mais bem realizado com uma frente mais ampla. Outro ponto importante da análise de Tavares diz respeito ao achatamento dos partidos, transformados, segundo ele, em agrupamentos de pessoas mais voltadas para interesses próprios. Outra crítica que faz refletir: as pesquisas induzem o eleitor na medida em que ninguém quer desperdiçar o seu voto. Ao ver o quadro pesquisado, tende-se a escolher o suposto vencedor. Ainda assim, diz, não tem jogo jogado.

Preocupado com defesa do meio ambiente, emergência climática e desigualdade, o jornalista, que foi para o exílio na troca de prisioneiros políticos pelo embaixador norte-americano sequestrado no Brasil, Charles Burke Elbrick, viu a campanha eleitoral distanciada dos pontos mais sensíveis. Para ele não há dúvida de que faltou manutenção do sistema de proteção contra cheias em Porto Alegre, o que facilitou a inundação da capital gaúcha quando das chuvas de maio de 2024. Flavio Tavares continua olhando bem à frente, querendo mais conteúdo e menos “marquetagem”.

O jornalismo agoniza? Para Tavares a atividade jornalística exige o domínio de uma técnica. Um amador fazer jornalismo, sustenta, é como um leigo tentar fazer uma cirurgia em alguém. Assim, garante que as redes sociais e os influenciadores não substituem jornais e jornalistas. Uma lição sobre política e jornalista dada por quem só não publicou em jornais, nas últimas sete décadas, quando esteve preso nas masmorras das ditaduras.

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