Juremir Machado da Silva

Reta final da campanha eleitoral

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Reta final da campanha eleitoral Melo e Rosário disputam segundo turno em Porto Alegre | Foto: Reprodução/Instagram

Quando se deve fazer o balanço das coisas? Antes ou depois dos resultados? Um militante deve fazer depois do apito final. Um comentarista político tem a obrigação de fazê-lo a qualquer momento, de preferência antes das definições para não ser profeta do acontecido. O balanço precoce incomoda os engajados, que reagem com um “não é hora de falar disso”. Quem falou antes, pode falar durante e, claro, muito mais depois dos fatos. É fato, porém, que o mensageiro da má notícia nunca será tido por simpático.

Muita gente imaginou que o presidente Lula seria figurinha repetida nas campanhas eleitorais de São Paulo e Porto Alegre. Não rolou assim. A candidatura de Rosário na capital gaúcha certamente contava com o apoio de Lula para tentar virar o jogo contra Sebastião Melo. Antes de sofrer uma queda e bater a cabeça, tendo de cancelar viagem à Rússia, Lula andou pelo país, levou o seu abraço a muito parceiro em disputa eleitoral. Porto Alegre não entrou no seu mapa. Observadores da política garantem que a explicação é uma só: a estrela do PT não quis embarcar na derrota anunciada da escolha do petismo, que sempre teve alta rejeição, num jogo jogado.

Na prática, Lula teria sinalizado algo assim: vocês quiseram, estou fora. Arquem com as consequências. Lula jogou a toalha. Não quis compartilhar um fracasso. Sabe-se que ele é partidário de alianças mais amplas. Foi assim que ganhou suas eleições. O petismo gaúcho, ao contrário, costuma ser mais restritivo. Rosário (PT) e Tamyres (PSOL) são as famosas duas faces da mesma moeda ideológica. Juliana Brizola, por exemplo, teria sido a face de uma moeda diferente, mesmo com valor de esquerda. Um parceiro de centro direita seria uma moeda ainda mais aberta como investimento. O PT lançou os seus dados, apostou contra a banca, arriscou seu capital, acreditou que com Lula em Brasília a mesa penderia para o seu lado mesmo com uma candidata incapaz de emocionar eleitores voláteis.

Uma parte mínima do PT acredita na virada de jogo, ainda que todas as pesquisas indiquem o contrário. Até agora saiu tudo conforme o roteiro ao qual o PT não quis dar crédito: separação no primeiro turno, divisão no segundo, os votos de Juliana rachados entre Rosário e Melo, com vantagem para Melo. Nem a enchente roubou votos do atual prefeito. A população de Porto Alegre tem mais rejeição ao petismo no momento do que tendência a responsabilizar Melo pelos grandes estragos das inundações. Pode-se chamar essa inclinação de legado do bolsonarismo ao eleitor porto-alegrense. Se, no passado, Porto Alegre foi de esquerda e se recentemente deu paradoxalmente vitória a Lula contra Bolsonaro, não está disposta a fazer o mesmo no varejo, ou seja, naquilo que a atinge mais diretamente.

Um princípio clichê do jornalismo ensina que não se pode brigar com os fatos. Há quem prefira garantir que fatos não existem, só interpretações. Rejeição eleitoral é fato. Nada pode anulá-la? Sim, pode acontecer. Basta que apareça um fato novo. Essa manchete não foi produzida. Fatos são realidades com uma estranha mania: não se importam com a opinião de quem quer que seja. Impõem-se contra tudo e todos com certa monotonia.

Fato é fato! O resto é interpretação – dizem os fatos.

De resto, quem podem criticar uma mulher competente e com vasta folha de serviços prestados à política de querer gerir a cidade onde vive?

Tambor tribal (Financiamento público de campanha)

Financiamento privado de campanha política era um convite à corrupção. Quem paga a conta, cobra. O financiamento público virou o paraíso dos donos de partido. Nunca se teve tanto dinheiro para alimentar candidaturas. Mais de R$ 6 bilhões. Cacique que não se eleja com esse sistema tem de ser muito ruim de voto. Não precisa nem sair por aí pedindo como antigamente. Dizem que é o custo de democracia. Faz sentido. Mas tem sido, antes de tudo, o preço do marketing. Em alguns lugares, foi também o valor do voto. Pagou-se para o eleitor ir à urna. Precisa campanha tão cara? Aliás, a campanha de Sebastião Melo, nos últimos dias, disposta a cativar o voto de extrema direita, apelou em musiquinhas contra o PT.

Parêntese da semana

“Parêntese #248: Partido”. Luís Augusto Fischer comenta a bomba do ano: “O cenário político da cidade – e do estado e do país, em outra escala – foi marcado nesta semana pelo anúncio, feito num debate público, da Manuela D’Ávila, de que ela se desligou de seu partido. Uma filiação de 25 anos, ela lembrou. Era o PCdoB. Por ele, ela foi candidata à prefeitura, foi vereadora, foi deputada estadual e federal, foi candidata a vice-presidente do país (para o candidato a presidente Fernando Haddad)”.

O PCdoB no RS sem Manuela é chimarrão sem água quente.

Luísa Kiefer mostra o caminho da edição: “Com as eleições em pauta, hoje trazemos alguns textos com reflexões necessárias sobre a política e os políticos. Guto Leite coloca Sebastião Melo ao lado de Pablo Marçal e questiona: se um homem trabalha mal, a gente deixa mesmo o homem trabalhar? Outra figura notória, Javier Milei, é abordada por José Roberto Iglesias em artigo sobre a desigualdade social e por Fernando Seffner, que relata a crescente insatisfação do povo argentino com o presidente eleito.  Depois de mais de 10 edições e muitas histórias, chega ao fim a nossa sessão sobre os 200 anos da imigração germânica, com a parte final do texto de Jandiro Koch, que aborda a imigração gay-alemã no RS. No texto de hoje, a vida e obra do artista Ernesto Frederico Scheffel. Já na biografia musical de Porto Alegre, Arthur de Faria narra a história de Carlinhos Hartlieb”.

Frase do Noites

Neoiluminista introspectivo: “A saudade é o cumprimento que o futuro faz ao passado tendo o presente como mensageiro iludido”.

Imagens e imaginários

No Pensando Bem, que vai ar todo sábado, 9 horas, na FM Cultura, 107,7, em parceria com a Matinal, a revista Parêntese e a Pro Hub, e apoio da Adufrgs Sindical, Nando Gross e eu entrevistamos Paulo Flores, ícone do teatro de vanguarda em Porto Alegre, fundador e esteio da mítica Terreira da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz. Uma conversa límpida com um homem que escolheu viver para a arte popular e experimental. Imperdível.

Escuta essa

Uma das mais belas músicas do cancioneiro brasileiro, com assinatura de João de Aquino e Paulo César Pinheiro, Viagem, na grande voz, hoje considerada anacrônica, de Nelson Gonçalves: um clássico imortal.

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