Quando o humor vira utilidade pública
Foto de Washington Oivetto no Instagram @washington.olivetto
Tive a honra de conviver com Washington Olivetto, uma alma criativa e generosa, que deixou uma marca profunda na publicidade brasileira e no mundo. Ele não foi apenas o maior publicitário que o Brasil já teve, mas também um dos mais brilhantes criadores do mundo.
Entre 2001 e 2011, tive o prazer de ser sócio de Washington Olivetto na Escala, empresa da qual eu também era sócio na época.
Washington enxergava o mundo por ângulos que poucos conseguiam ver. Seu foco sempre foi criar, imaginar e transformar ideias em algo extraordinário. Ele deixou a parte de “business” nas mãos do sócio Javier Llussá, a quem chamavam de “o empresário do mágico”, porque Washington era realmente um mago da publicidade.
Com uma paixão imensa pela cultura brasileira, Washington encontrava na música, na arte e no futebol as fontes de sua inspiração. Ele era amigo dos maiores músicos do país e um corinthiano fanático, o que só fortalecia sua conexão com o Brasil e sua autenticidade. Ele não apenas levou a publicidade brasileira a um patamar internacional inédito, mas também inspirou e formou gerações de criadores, que o enxergavam como referência e guia.
Lembro-me com carinho de quando resolvi organizar um livro sobre o humor na propaganda, uma ideia sugerida pelo querido psicanalista Abrão Slavutzky, outro apaixonado por humor. Não tive dúvidas sobre quem consultar: Washington, o mestre que trouxe o humor para o centro da publicidade brasileira.
Ele já havia criado campanhas memoráveis, como a icônica do Garoto Bombril, que durou incríveis 41 anos, e também inovou ao levar leveza e humor para o sério segmento bancário com o Casal Unibanco.
Quando pedi sua ajuda para o livro, Washington, com sua habitual generosidade, não hesitou. Pedi que me desse uma grande entrevista sobre o humor na propaganda. Que me colocasse em contato com Sir John Hegarty, fundador da BBH, um ícone da propaganda inglesa.
E com Jeff Goodby, um dos maiores nomes da publicidade dos EUA. É dele a afirmação de que a melhor propaganda é como vandalismo — barulhenta, engraçada e ainda lá no dia seguinte.
Dos brasileiros, pedi que me aproximasse de Carlos Moreno, o eterno Garoto Bombril, e da Turma do Casseta e Planeta. Em pouco tempo, Washington fez tudo isso acontecer. As respostas chegaram com a rapidez que só ele poderia proporcionar, com sua rede de contatos globais.
Luiz Fernando Veríssimo também enviou um texto seu.
A entrevista que fizemos foi um momento especial, na presença de Abrão e Eduardo Axelrud, então diretor de criação da Escala. Foram mais de três horas de uma conversa rica e inspiradora.
Logo depois, Washington saiu de Porto Alegre e voltou a São Paulo. Antes de chegar na sua agência, foi sequestrado, gerando uma comoção que abalou a todos nós. A tensão daqueles dois meses foi indescritível e, além do drama pessoal, eu carregava a preocupação com a entrevista e o livro que ainda estava tomando forma. E se o pior acontecesse, o que eu faria com a última entrevista de um gênio como Washington?
Felizmente, ele foi libertado, são e salvo, e o livro pôde seguir seu caminho. O resultado foi um legado precioso sobre o humor na propaganda revelando, através de entrevistas, artigos, crônicas e pesquisas, como o humor não só fazia rir, mas também vendia. Quando mostrei ao Washington o título do livro, “O Humor Abre Corações”, ele, com seu brilhantismo habitual, acrescentou: “E Bolsos!”
Ele afirmava que “quando os tempos são difíceis o humor aumenta e se torna quase um serviço de utilidade pública.” Washington Olivetto é e sempre será uma figura inesquecível, um mestre que não apenas elevou a publicidade, mas também tocou corações com sua criatividade, generosidade e espírito visionário.
Alfredo Fedrizzi é pai da Lissa (38), Laura (34) e Maria (6 anos), fazendo Mestrado em Antropologia na Universidade de Lisboa, atuando em Conselhos de Administração no Brasil, ex-professor de Televisão na PUC, ex-publicitário.
