Nossos Mortos

A simpatia em pessoa

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A simpatia em pessoa Foto: Arquivo pessoal

A morte do escritor chileno Antonio Skármeta, na terça-feira, 15, aos 83 anos, silenciou uma importante voz da literatura latino-americana, que projetava esta para uma escala mundial. Seu romance O carteiro e o poeta, lançado originalmente com o título de Ardente paciência, em 1985, e adaptado para o cinema com sucesso, consagrou o seu estilo e a sua forma de escrever, em prosa leve, com enredos marcados pela poesia e pelo debate de temas universais. Aprende-se com Skármeta sobre a condição humana e sobre as questões sociais e políticas da América Latina. 

Cidadão de amplitude mundial, que foi professor universitário (inclusive nos Estados Unidos), cineasta, diplomata (foi embaixador do Chile na Alemanha), sabia estabelecer fortes vínculos por onde quer que passasse. Ao Brasil, veio inúmeras vezes para eventos literários em vários estados. Mas tinha apreço todo especial pelo Rio Grande do Sul (torcia pelo Grêmio, por exemplo) e, nele, por uma cidade em particular: Santa Cruz do Sul.

Pessoalmente, testemunhei essa relação afetiva. A começar pelo fato de que o entrevistei várias vezes. A primeira, em 2001, em Berlim, quando era embaixador e eu integrava intercâmbio. Em 2011, houve nova conversa, desta vez em Santiago do Chile, para onde ele retornara, e em contato feito em plena noite de seu aniversário, em 7 de novembro.

Desses contatos decorreu convite para que ele fosse o patrono da Feira do Livro de Santa Cruz em 2012, o que prontamente aceitou. Foi o primeiro e o único estrangeiro até hoje a ocupar tal condição. Sua passagem pela cidade foi muito marcante. Tanto que, novamente convidado, aceitou elaborar narrativa curta exclusiva para antologia que eu e um amigo, Rudinei Kopp, idealizamos, de título Nem te conto. Em “Oktoberlied”, seu texto, a história está centrada em uma viagem que, curiosamente, se encerra em Santa Cruz. E ele retornou ao Estado no ano seguinte, 2013, para o lançamento da antologia, com eventos em Porto Alegre e, uma vez mais, Santa Cruz.

Mas não só. Na vinda em 2012, conheceu o músico santa-cruzense Killy Freitas, que lhe mostrou seu trabalho. Encantado, Skármeta, que também compunha, firmou parceria de criação com ele: repassava letras de canções, e Killy elaborava a melodia. O resultado é o álbum Café Frio, que teve lançamentos em Santiago do Chile e em Brasília.

Ainda em Santa Cruz, em 2013, se reuniu com o ator e diretor Selton Mello, que fora à cidade especialmente para se encontrar com o escritor chileno. Da conversa, resultou parceria para a adaptação da novela “Um pai de cinema”, que nas telas chama-se “O Filme da Minha Vida” longa dirigido por Selton, com gravações tendo ocorrido na Serra Gaúcha (Skármeta insistira muito porque queria que fosse filmado em Santa Cruz, o que não se viabilizou).

Skármeta deixou obra ampla, em vários gêneros, e de qualidade, que seguirá sendo lida e relida. E deixou também um exemplo de um intelectual e de um artista integrado, engajado, afetuoso e gentil. Era a simpatia em pessoa.

 

Foto: Arquivo pessoal

 


Romar Rudolfo Beling é jornalista.

 


As opiniões emitidas pelo autor não expressam necessariamente a posição editorial da Matinal.

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