Crônica

Políticas do encanto, Sarau elétrico e a importância do diálogo para a construção de aprendizagem

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Políticas do encanto, Sarau elétrico e a importância do diálogo para a construção de aprendizagem

O processo de ensinar e de aprender é dependente da construção de conexão, de senso de pertencimento, de um espaço de confiança. 

Para mim, esses elementos estão entre aqueles que constituem a essência da educação. 

Sem isso, fica difícil aprender. E a melhor maneira de criar esse espaço é através do diálogo, de uma conversa.

Um dos principais conceitos relacionados a este tema é a ideia de conversational learning, que se consolida como uma abordagem de ensino e aprendizagem baseada na prática da teoria da aprendizagem experiencial.

Tenho pesquisado e aplicado essa proposta, desde o momento em que li o primeiro texto de Alice Kolb sobre este tema, mas a importância dessa construção se enfatizou ao longo do tempo, especialmente devido a polarização social que vivemos, decorrente das construções sociais digitais. 

As redes virtuais criaram grandes vales, distantes e desconexos, tendo como principal recurso para o pertencimento não o afeto, não o amor, mas o ódio. 

Os espaços de diálogo se romperam e a forma de tratar o diferente se transformou. 

Saiu de pauta a curiosidade, a busca pela compreensão do outro, e entrou em nosso dia a dia o ódio, o desprezo pelos outros.

Li recentemente o livro Políticas do encanto, de Paolo Demuru, onde o autor percorre conceitos como dissonância cognitiva, pós-verdade, a partir de uma perspectiva semiótica. Um texto de grande valor, que amplia nosso olhar para a compreensão de um problema que está em alguma medida em todos os espaços que frequentamos e que busca potenciais alternativas de solução. Para mim, a principal, é o diálogo.

Na política ou na educação, o caminho para a construção de algo mais relevante e de grande valor, passa pela conversa.

Pensei nisso quando fui ao Sarau Elétrico capitaneado pela Katia Suman, que tinha como tema justamente a busca de diálogos na literatura.

Eu sou frequentador assíduo deste espaço, que reúne cultura, literatura, música, em uma das casas mais icônicas de nossa cidade, o bar ocidente. 

Toda semana temos na pauta diferentes temas e diferentes convidados. 

Em alguns dias de sarau a conversa e as leituras fluem melhor, mas sempre é um momento de aprendizagem. Entretanto, neste último, apenas com o pessoal da casa (Fischer, Katia e Grando) e a Claudia Tajes (que funciona como um quarto elemento no grupo) tive a melhor experiência dos últimos tempos.

Essa experiência única está vinculada ao tema da noite e ao formato que eles utilizaram para as leituras. 

O tema, já compartilhei alguns parágrafos acima, diálogos. O formato, em boa parte da noite, foi a interpretação dos diálogos no grupo, cada um deles, entrando no personagem e nos trazendo a melhor leitura possível.

Essa construção, além de gerar engajamento, nos colocava dentro de uma conversa. Uma conversa que assistimos, mas que também protagonizamos com nossa reação às interpretações e a leitura.

O diálogo promove relacionamento a partir de um processo que envolve características estritamente humanas: a incerteza da resposta, a imprevisibilidade da reação do outro, a surpresa, o inesperado, a mudança do tema em debate, a escuta ativa, entre tantas outras possibilidades que se colocam em pauta, quando alguém inicia uma conversa. 

O diálogo é potencial promotor de engajamento, pertencimento e bem-estar. Quando alguém chama outra pessoa para compartilhar o que tem de melhor, as suas ideias, quando alguém torna o seu conhecimento tácito explicito, temos potência pura para transformar, para aprender.

Talvez seja realmente a partir da prática da conversa o caminho para um mundo melhor, para um espaço de maior pertencimento, bem-estar, engajamento e consequentemente de respeito, harmonia, afeto.

 


Gustavo Borba é pesquisador, escritor e professor na Unisinos.

 


As opiniões emitidas pelo autor não expressam necessariamente a posição editorial da Matinal.

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